Os resquícios do Brasil Império no Rio de Janeiro – Voupranos

Os resquícios do Brasil Império no Rio de Janeiro

Adobe Stock: ilustração da realeza- sforzza

Este roteiro começa no Rio de Janeiro. Mais precisamente, em 7 de março de 1808, com a chegada da família real portuguesa ao Brasil. Numa bela sacada de marketing, o comerciante Elias Antônio Lopes tratou logo de doar sua propriedade, no bairro de São Cristóvão – onde havia erguido, cinco anos antes, um casarão sobre uma colina da qual se tinha uma “boa vista” da Baía de Guanabara –, ao príncipe regente D. João VI. A Quinta da Boa Vista, que se tornou residência oficial dos Orleans e Bragança, serve, assim, como ponto de partida atualmente para uma viagem ao passado, pelos tempos do Brasil Império.

Tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a casa hoje abriga o Museu Nacional, onde uma das peças de maior destaque é o crânio de Luzia, o mais antigo fóssil humano das Américas. Mas a Quinta é programa para um dia inteiro. Aos fins de semana, atrai famílias que fazemo piqueniques nos gramados, alugam caiaques e pedalinhos, passeiam de bicicleta e trenzinho. Ou visitam, ainda, o zoológico do Rio, o primeiro do País.

Adobe Stock: Interior da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro – rudiernst

Aqui, mais uma pausa para a história: ter vindo para o Brasil fugindo das tropas de Napoleão Bonaparte não significa que a família real deixou Portugal com a roupa do corpo. Na verdade, foram 14 os navios que aportaram no país – com membros da corte, além de joias, obras de arte, livros, manuscritos e plantas.

Estas últimas levaram D. João, ainda em 1808, quando tomou posse de terras na Lagoa Rodrigo de Freitas, a criar o Jardim de Aclimação, com o objetivo de aclimatar as fontes de especiarias acumuladas em viagens para as Índias Orientais, como noz moscada, canela e pimenta do reino. O lugar deu origem ao Jardim Botânico, um dos refúgios preferidos dos cariocas na zona sul da cidade, com cerca de 8 mil espécies, incluindo palmeiras imperiais iguaizinhas à que o próprio príncipe regente plantou em 1809.

Já os livros trazidos pela família imperial da Real Biblioteca de Ajuda, em Lisboa, formaram a Biblioteca Nacional, fundada em 1810, mas que só abriu suas portas ao público em 1814. Com acervo calculado em 9 milhões de itens, ela é, hoje, uma das dez maiores bibliotecas no mundo. Diariamente, a partir de 10h, há visitas guiadas que permitem apreciar não só suas obras como a bela arquitetura do edifício. Está localizada no Centro da cidade, uma área que passou por transformações profundas a partir da chegada da família real.

Adobe Stock: Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro – Giampaolo

Centro Histórico

Na Praça XV, uma das principais do Centro do Rio de Janeiro, o edifício onde funcionava a Casa dos Governadores foi promovido a Paço Imperial e usado como gabinete de despachos por D. João. Tornou-se palco das coroações de D. Pedro I e D. Pedro II. Em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel assinou ali a Lei Áurea, abolindo a escravidão. Atualmente, a edificação funciona como um centro cultural, com mostras de pintura, fotografia, escultura e música.

Por todo esse charme histórico, o Centro do Rio é feito na medida para ser percorrido a pé. Ao deixar para trás a Praça XV, siga até o Largo da Carioca, onde se ergue o Convento de Santo Antônio, de 1780, que compreende ainda a Igreja de São Francisco da Penitência. Feche os olhos nesse momento e tente ouvir os sinos que badalavam todo 4 de outubro, quando D. João subia a ladeira do Convento, cumprindo seus votos de assistir, anualmente, à missa solene em honra a São Francisco de Assis.

Adobe Stock: Paço Imperial, Rio de Janeiro – Gabrielle

Depois, com a alma saciada, vá saciar o estômago. É só entrar na Rua da Carioca e fazer uma parada no Bar Luiz, de 1887, um dos primeiros do Rio a servir chope, com cardápio inspirado na culinária alemã. A mesma Rua da Carioca vai levá-lo à Praça Tiradentes. Nela está a estátua equestre em homenagem a D. Pedro I, a primeira instalada em uma praça pública no Brasil, inaugurada em 1862 com a presença de D. Pedro II e de uma orquestra com mais de 600 músicos.

Aproveite para observar, ainda, o Real Gabinete Português de Leitura, de 1887, cuja inauguração contou com a Princesa Isabel, e o Teatro João Caetano, de 1813, onde foi promulgada, em 1824, a primeira Constituição brasileira. No momento da solenidade, o teatro pegou fogo. Foi reconstruído e reinaugurado por D. Pedro I dois anos mais tarde. Da Praça Tiradentes, dobre na Rua do Lavradio, um pouco mais adiante, que vai conduzi-lo aos Arcos da Lapa.

Adobe Stock: Bondinho de Santa Teresa, Arcos da Lapa – Luciano Luppa

Antigo Aqueduto da Carioca, foi a maior obra arquitetônica do período colonial, construído para distribuir à população as águas do Rio Carioca. Durante o império, novas alternativas de abastecimento foram sendo utilizadas e, após a proclamação da república, o aqueduto terminou se convertendo em via para os bondes.

Adobe Stock: Arcos da Lapa, Rio de Janeiro – marchello74

Floresta da Tijuca

Se o assunto é água, entretanto, não deixe de conhecer a Floresta da Tijuca. Fruto de reflorestamento ordenado por D. Pedro II em 1861, quando ficou latente que o desmatamento causado pelas fazendas de café estava comprometendo o abastecimento de água potável da cidade, a floresta é um belo espaço de lazer, acessado a partir do Alto da Boa Vista.

Adobe Stock: Mirante da Cascatinha, Rio de Janeiro – Bernard Barroso

Faz parte do Parque Nacional da Tijuca, que abriga o símbolo mor do Rio de Janeiro, a estátua do Cristo Redentor. Para chegar até ela, você vai embarcar num trenzinho e percorrer estrada de ferro cuja construção foi autorizada por D. Pedro II, que em 1824 liderou uma expedição ao topo do Corcovado, abrindo caminho para o cume onde hoje, de braços abertos, está aquela que é uma das sete maravilhas do mundo moderno.

Adobe Stock: Floresta da Tijuca, Rio de Janeiro – lazyllama

O último baile do império

O endereço final do roteiro pelo Brasil Império no Rio de Janeiro é o prédio da Ilha Fiscal, projetado em 1881 em estilo neogótico. Ali foi realizado o último baile do império, no dia 9 de novembro de 1889. As visitas guiadas mostram o prédio, os salões, o torreão e as exposições permanentes do espaço. O acesso à ilha é feito na Escuna Nogueira da Gama, a partir do Complexo Cultural da Marinha, na Praça XV.

Adobe Stock: Baía de Guanabara, Rio de Janeiro – Maarten Zeehandelaar

O último baile da monarquia custou aos cofres do Rio algo em torno de 250 contos de réis – quase 10% do orçamento previsto para aquele ano. Dinheiro, dizem, que deveria ser destinado a vítimas da seca no Ceará. E acabou sendo gasto com 18 pavões, 25 cabeças de porco, 64 faisões, 300 peças de presunto, 500 perus, 800 quilos de camarão, 800 latas de trufas, 1.200 de aspargos, 1.300 galinhas, 12 mil taças de sorvete, 18 mil frutas e 304 caixas de bebidas, como publicou a Gazeta de Notícias. Sem dúvida, uma festa digna de reis e rainhas. Poucos dias depois veio a proclamação da República e a família imperial foi obrigada a seguir para o exílio na França. Mas este já é outro roteiro.

Adobe Stock: Baile – ProArt Studios

Publicado em: 30/10/2024
Atualizada em: 30/10/2024
Quero contribuir com essa matéria dos Voupranos

Veja também:

Voupra