O que fazer na Borgonha, região conhecida pela rota de vinhos
Com tantas belezas para ver na Borgonha, é estranho notar que, na região, há sempre alguém olhando para o céu para descobrir o que fazer. Seja num pequeno vilarejo no meio dos vinhedos, seja nas áreas abertas dos castelos medievais que se transformaram em sofisticados hotéis, uma nuvem fora de hora – ou a falta de uma delas – deixa os borgonheses alertas.
Em pleno século XI, com um dos mais valiosos e movimentados negócios de vinho do mundo, essa singela região francesa ainda é muito rural. Ela depende totalmente dos ciclos da natureza e valoriza aqueles que sabem distinguir as cores da terra e os movimentos do céu.
Prova disso é que, com exceção da cidade de Dijon, não se avistam prédios modernos na Borgonha, situada a cerca de três horas de Paris para quem chega de carro ou a apenas 1h40 de TGV, o trem rápido francês. Seu território é pouco maior que o de Alagoas e equivalente ao da Bélgica.
Dijon
A própria Dijon, com 150 mil habitantes, não passa de uma cidade média, embora seja a maior da região e tenha uma praça central imponente, com o belíssimo conjunto arquitetônico do Palais des Ducs. Basta andar alguns quarteirões pelas vielas centrais do município e depois pelos parques que o cercam para cair na zona rural.
O passado medieval pode ser facilmente reconhecido em qualquer cidade ou vilarejo bourguignon, como as charmosas Vergisson e Semur en Auxois. E o que é melhor: sempre com muito estilo e alta dose de sofisticação.
Borgonha fica no centro da França, entre o leste alpino, o oeste normando, o sul provençal e o norte urbano de Paris. A posição estratégica faz da região um dos maiores enclaves econômicos e culturais da Europa desde a Idade Média. Esteve na rota das especiarias – como a mostarda típica não deixa ninguém esquecer – e foi um centro de poder político que rivalizava com a própria coroa francesa.
Porém, sua riqueza nasceu mesmo da paciência dos monges cistercienses. Tradicionais observadores dos ciclos da natureza. Foram eles que, ainda no século XII, fizeram as primeiras demarcações de terra para a produção de uvas.
Os monges notaram que cada pedaço de solo produzia uma uva que dava vinhos de sabores diferentes, apesar de usarem sempre o mesmo tipo de uva: a emblemática pinot noir.
A maior herança arquitetônica deixada pelos monges é a austera Abadia de Fontenay, do século XII. Quem a visita percebe que os religiosos levavam uma vida de privações, mas divinamente aplacada pelo fabuloso vinho local.
Vinícolas
Na Côte d’Or, região que pertence à cidade de Beaune, produz-se até hoje o mesmo vinho que o tempo e o terroir provaram ser o mais adequado a cada pequeno lote – os tintos feitos a partir da pinot noir, e os brancos, em proporção bem menor, da uva chardonnay.
Ali ficam os vinhedos Clos de Vougeot, Montrachet e Romanée Conti – que produzem três dos cerca de 30 Grand Crus da Borgonha. Encontrar os vinhedos com esses nomes é fácil: a Côte d’Or é a zona rural da cidade de Beaune e compreende uma sequência de vilarejos medievais bem sinalizados por charmosas placas e ligados por estradas de terra arborizadas, onde não passam caminhões.
Em cada vilarejo, há invariavelmente uma colina, um château – que pode ser um castelo ou um casarão de pedra –, ruas estreitas com um comércio de produtos locais (incluindo vinhos rústicos) e vinhedos em todo espaço de terra disponível.
Ao se afastar um pouco da Côte d’Or para explorar os outros caminhos da Borgonha, surgem pastos de gado charolês e parques nacionais. Castelos imensos são, muitas vezes, habitados por herdeiros que adoram receber visitantes (desde que estes paguem pela visita para ajudar na manutenção).
Em Avallon, no oeste da Borgonha, a paisagem é dominada pelas muralhas que cercam a vila do século XII, ligada à mítica história do rei Arthur. Em tempo: como as construções antigas ficam no alto de uma colina, a formação de neblina é comum, como sugere o título do best-seller dos anos 1980 As Brumas de Avallon, de Marion Zimmer Bradley. Já pelos caminhos do sul da Borgonha, vale visitar a imensa abadia do século X que deixa a cidade de Cluny à sombra – no bom sentido.
Beaune
Beaune, cidade muito charmosa com pouco mais de 25 mil moradores, ocupa uma estratégica posição central no mapa da Borgonha. É a capital do negócio do vinho na região. Foi com o dinheiro da produção vinícola que foi erguida uma das construções mais imponentes da França no centro da cidade: o Hôtel-Dieu.
A antiga hospedaria, que ainda funciona, transformou-se também em um museu. Ele abriga importantes obras de arte religiosa e tem ambientes originais preservados – como a botica onde os remédios eram preparados.
Anualmente, no terceiro domingo de novembro, o mais famoso leilão de vinhos do mundo arrecada dinheiro para manter o Hôtel-Dieu. Negociantes dos mais diversos países aparecem para arrematar lotes da bebida e acabam influenciando no preço que ela terá nos anos seguintes.
Na véspera do leilão, acontece o sofisticado banquete dos Chevaliers du Tastevin, a confraria de vinho mais cheia de tradições no mundo. O banquete é realizado normalmente em um castelo e tem pratos harmonizados com os vinhos – e não o contrário.
Dominado pelo Hôtel-Dieu, o centro da cidade de Beaune é uma sucessão de vielas estreitas e curvas repletas de boas lojas de vinhos e bistrôs de preços variados. Um canal bucólico atravessa a cidade e é cercado de praças.
Na maior delas, cafés e um carrossel remanescente de outros tempos dão um colorido especial. Polo gastronômico famoso em todo mundo, Beaune costuma ter suas mesas mais valorizadas sempre ocupadas – por isso, vale fazer reserva para jantar nos restaurantes renomados.
Atualizada em: 30/03/2023