As paisagens exuberantes que tomam conta do Pantanal
Pequenas ondas na superfície e pássaros espreitando na margem do rio indicam um cardume por perto. Cupinzeiro alto é prenúncio de ano chuvoso. Quando uma queixada estala os dentes, pode apostar que está nervosa e pretende atacar (há quem se defenda urinando sobre o bando). Já a onça prefere estalar as orelhas: se você der de cara com uma e ouvir esse sonido, pode começar a rezar… No Pantanal, a natureza tem sua linguagem, seus códigos próprios que permeiam todas as suas atrações.
Todo pantaneiro que se preza logo aprende a compreender esses recados e respeitar os limites de convivência com as mais de mil espécies de fauna que habitam a maior planície inundada do planeta. Mas tanto homens quanto animais subjugam-se a uma força maior: a das águas. São elas que ditam o ritmo da vida na região, que tem 220 mil quilômetros quadrados e abrange boa parte dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além de pequenos trechos da Bolívia e do Paraguai. Também são elas que definem o que o visitante vai ver ou deixar de ver.
Quando ir
Entre julho e setembro, a seca revela ao máximo o esplendor da fauna local. É uma época excelente para fazer safáris e se aproximar de jacarés, capivaras, veados, ariranhas e até onças bebendo água na beira dos rios. Sem falar que a fase de reprodução das aves, como os emblemáticos tuiuiús, garante cliques memoráveis aos aficionados por bird watching. Já no período de outubro a março, os rios que correm das montanhas para lá se enchem, inundando tudo gradualmente.
A alta quantidade de argila no solo se encarrega de impedir a absorção e a área vira um gigantesco alagado, rico em alimentos para os animais selvagens. Em abril, começa a vazante: os leitos dos rios vão baixando, o calor exagerado dá uma trégua e formam-se baías com grande quantidade de peixes, que servem de banquete aos pássaros aquáticos. Porcos-do-mato, cervos, tamanduás e macacos voltam a mostrar a cara mais facilmente em meio à vegetação, que proporciona um belíssimo espetáculo de cores e formas. E os apaixonados por pesca aproveitam a fartura para fisgar pacus, traíras, piranhas, dourados e piraputangas, entre as mais de 300 espécies de peixes.
Transpantaneira
Visitar tamanha maravilha, entretanto, requer algum esforço do viajante. Para quem chega a Mato Grosso de avião, via Cuiabá, a porta de entrada para este universo paralelo é a cidade de Poconé, a 108 km da capital mato- grossense. É lá que começa a Rodovia Transpantaneira (MT 060), que segue até Porto Jofre, já na divisa com Mato Grosso do Sul. O desafio de encarar milhares de buracos na pista e de transpor centenas de pontes mais frágeis que um bicho-preguiça, entretanto, é muito bem recompensado pelos animais que desfilam ao alcance dos olhos sem
qualquer receio.
Afinal, neste imenso zoológico a céu aberto, é o visitante quem deve ficar “enjaulado” dentro do carro enquanto os bichos se exibem livremente na natureza. Biguás, gaviões, colhereiros, garças e tuiuiús quebram o sossego dos campos verdes encharcados, enquanto jacarés, capivaras, veados e até sucuris cruzam tranquilamente a via deserta. São mais de 650 espécies de aves, 95 de mamíferos e 50 de répteis.
Rios Pixaim e safári noturno
Além de servir de safári, a Transpantaneira funciona como meio de acesso às fazendas que se espalham pela primeira metade da estrada, entre Poconé e o Rio Pixaim. De uns anos para cá, várias delas resolveram abrir suas portas ao ecoturista, criando estruturas para passeios de barco, cavalgadas e trilhas seguras para que os visitantes possam observar de perto os animais sem atrapalhá-los.
Vale a pena, por exemplo, fazer um tour pelo Rio Pixaim ao amanhecer, quando os primeiros raios de sol ainda estão despontando no horizonte, colorindo o céu pantaneiro com uma infinidade de nuanças de rosa, laranja, azul e amarelo. Ou então ao pôr do sol, momento em que as aves promovem um espetáculo de revoadas antes de se refugiarem nos ninhos.
Quando a noite cai, é hora de fazer um safári noturno a bordo de uma jardineira adaptada. Além de milhares de olhos de jacarés que brilham na escuridão à beira dos rios, você pode dar a sorte de ver uma onça-pintada.
Peixe na mesa
Embora as fazendas de gado dominem boa parte da região, os pantaneiros gostam mesmo é de peixe. Lá, os restaurantes especializados são chamados de peixaria e servem opções para todos os paladares, desde ventrecha (“costelinha” de pacu frita) e dourado ou piraputanga assados na folha de bananeira até mojica (com mandioca) e feijoada de pintado, que é feita com feijão branco e pedaços do peixe no lugar da carne suína.
Como entrada, o caldo de piranha é um must have, principalmente para aqueles que acreditam em suas propriedades afrodisíacas, tão ‘porretas’ quanto as do canjinjim – bebida típica do município de Vila Bela da Santíssima Trindade (feita com aguardente, mel, cravo e ervas) e que chega a ostentar no rótulo o título de Viagra Natural. Para acompanhar tantas especialidades, quase todos os restaurantes de Cuiabá, Várzea Grande e Poconé oferecem arroz maria-isabel (semelhante ao carreteiro, só que com carne picada), farofa de banana-da-terra, paçoca de pilão (farinha de mandioca socada com carne-seca) e pirão de peixe.
Atualizada em: 06/10/2023